Um intenso trabalho de formação de plateia, a construção de grandes palcos na década de 90 e a posição estratégica de Curitiba estão entre os fatores que fazem a cidade figurar em tantas turnês internacionais. Esse é um dos temas do Arte & Cultura desta quinta-feira (16), da TV Assembleia, que recebeu o jornalista e agitador cultural Abonico Smith, carioca radicado na capital paranaense.
Com a autoridade de alguém que acompanha a cena musical em Curitiba há cerca de quatro décadas, Abonico detalha a revolução representada pela inauguração da Pedreira Paulo Leminski, em 1990. “Foi quando passamos a receber shows de maior público. Quem se apresentou naqueles primeiros anos foi Paul McCartney. Antes não havia como, pois não tínhamos um palco de grandes proporções para abrigar esses artistas”.
Antes, espaços como a casa de shows Aeroanta, no bairro Rebouças, e o Teatro Guaíra, no Centro, eram os principais endereços para grandes apresentações na Capital. Entre os nomes que passaram pela primeira, está Little Richard, considerada a “mãe do rock”. Ambas as casas foram fundamentais para disseminar a paixão pelas grandes apresentações em Curitiba, apesar de estarem limitadas a 800 e 2100 pessoas, respectivamente – bem aquém da capacidade da Pedreira em abrigar 24 mil cabeças.
A imprensa cultural também teve papel importante para a criação deste público. Antônio Carlos, nome oficial de Abonico, cita a Rádio Estação Primeira, que dava espaço tanto para nomes consagrados como para artistas locais e independentes. Tudo isso numa época em que ter acesso à informação era tarefa complicada.
“Curitiba sempre teve um público que consome muito rock, muito por conta dessa formação de plateia”, destaca o jornalista. A posição estratégica da Capital, fácil de ser acessada por paraguaios e moradores do Centro Oeste, e a proximidade de São Paulo e Rio de Janeiro, cidades que também integram a agenda internacional, também contribuem para a atratividade da cidade. “É mais fácil para as bandas chegarem aqui que em Porto Alegre ou no Nordeste”, ilustra.
Trajetória
A entrevista também aborda a trajetória do jornalista. “Ter acesso a telefone era muito difícil. Eu morava no Jardim Botânico [bairro de Curitiba] e precisava ir ao Centro, na central telefônica, para ligar para São Paulo. Ligava para a redação da revista Bis para arrumar matérias [para produzir]”, lembra Abonico, sobre as dificuldades de ser repórter cultural no início dos anos 90.
Com parte da família paranaense e parte fluminense, ele nasceu em 1972, no Rio de Janeiro. Em 1987, a família se muda para Curitiba, fugindo da violência carioca. No mesmo ano, Antonico começa a escrever sobre música. É o início de uma carreira marcada por acompanhar bandas, viajar para assistir grandes shows e produzir para a grande imprensa.
Separar o fã do jornalista sempre foi um princípio, detalha Abonico. Ao elencar apresentações inesquecíveis, ele cita quando David Bowie veio à Capital em 1997, no Close Up Planet, na Pedreira. “Não era a turnê do melhor disco do Bowie, mas foi um bom show”, pontua. Já a vinda de AC/DC para Curitiba, no ano anterior, ficou mais marcada pela morte de Renato Russo, que ocorreu no mesmo dia, do que pela apresentação em si.
Abonico percebe hoje uma mudança que se acentua desde a pandemia: a redução expressiva em atrações de pequeno e médio porte. “Quando eles acontecem, atraem principalmente pessoas com mais de 40 anos”, percebe o jornalista. “Com a internet, a celebração da música se tornou mais unitária e individual”. Por outro lado, os grandes shows teriam a vantagem de serem “instagramáveis”, mas repetem um padrão.
Para ele, a disseminação de vídeos na internet reduziu tanto a “transmissão oral” do show, quando as pessoas descrevem a experiência; quanto o caráter inédito dele, pois as pessoas podem hoje assistir uma turnê antes que ela chegue em sua cidade – antecipando assim o que veriam.
“Hoje eu prefiro ver shows pequenos”, ressaltou Abonico. “O show menor, mais perto do público, é sempre mais poderoso. Minha expectativa é sempre para as apresentações menores, para as bandas de menor alcance e menor popularidade. É a forma de fugir da mesmice”.
Onde assistir
O programa é exibido toda quinta-feira, às 13h, na TV Assembleia, no Canal 10.2. A entrevista com Marcos Stankievicz Saboia também pode ser conferida no canal do Youtube TV Assembleia do Paraná, a partir do mesmo horário.
Gravado no Salão Nobre da Assembleia Legislativa, o Arte & Cultura traz artistas, músicos, cineastas e comunicadores paranaenses e brasileiros para debater a produção cultural e histórica do Paraná e do Brasil.
A cada semana, a atração recebe grupos folclóricos, coreógrafos, maestros, diretores de museus, artistas plásticos, diretores e produtores de teatro, escritores e poetas para um papo descontraído sobre o mundo das artes.